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Sala de cinema IMAX no Centro Comercial Colombo em Lisboa |
Qual o estado do cinema português actualmente? Com curiosidade para responder a esta questão, e quase dois anos após a morte de um dos mais reconhecidos realizadores portugueses, Manoel de Oliveira (falecido a 2 de Abril de 2015), fui analisar alguns dados oficiais sobre este tema, para poder haver uma discussão aberta e podermos compreender melhor como anda a produção nacional cinematográfica.
Todos os dados recolhidos neste artigo foram retirados do ICA - Instituto do Cinema e do Audiovisual, um instituto público criado em 1971 que tem diversas competências, entre elas a atribuição dos apoios financeiros que o Estado disponibiliza para a produção de cinema em Portugal, assim como estabelecimento de protocolos, registo de obras cinematográficas e audiovisuais, entre outras competências.
Com base em diversos dados e informações, analisaremos como correu o ano cinematográfico de 2016 para o cinema português. Abaixo encontra-se uma lista completa de todos os filmes que tenham produção nacional, e que estrearam em Portugal, ao longo do ano passado:
Filmes com produção Portuguesa estreados em 2016:
JANEIRO:
Jogo de Damas - Patrícia Sequeira - Ficção
Quatro - João Botelho - Doc
FEVEREIRO:
Lisbon Revisited - Edgar Pêra - Doc
MARÇO:
Gelo - Luís e Gonçalo Galvão Teles - Ficção
O Amor é Lindo... Porque Sim! - Vicente Alves do Ó - Ficção
Posto-Avançado do Progresso - Hugo Vieira da Silva - Ficção
John From - João Nicolau - Ficção
ABRIL:
Gesto - António Borges Correia - Doc
MAIO:
Axilas - José Fonseca e Costa - Ficção
Rio Corgo - Sérgio da Costa e Maya Kosa - Doc (co-prod)
Mudar de Vida, José Mario Branco, vida e obra - Nelson Guerreiro e Pedro Fidalgo - Doc (co-prod)
Aqui, em Lisboa: Episódios da Vida da Cidade - Gabriel Abrantes e Denis Côté - Ficção
Cinzento e Negro - Luís Filipe Rocha - Ficção (co-prod)
JUNHO:
Grandes Esperanças - Miguel Marques - Doc
Olmo e a Gaivota - Petra Costa e Lea Glob - Doc (co-prod)
JULHO:
A Canção de Lisboa - Pedro Varela - Ficção
AGOSTO:
Refrigerantes e Canções de Amor - Luís Galvão Teles - Ficção
SETEMBRO:
Cartas da Guerra - Ivo M. Ferreira - Ficção
OUTUBRO:
O Cinema, Manoel de Oliveira e Eu - João Botelho - Doc
Rasgar o Passado - Cláudio Jordão, Luís Diogo, João Costa e José Miguel Moreira - Ficção
O Ornitólogo - João Pedro Rodrigues - Ficção
NOVEMBRO:
A Toca do Lobo - Catarina Mourão - Doc
SACA - O filme de Tiago Pires - Júlio Adler - Doc
DEZEMBRO:
Estive em Lisboa e Lembrei de Você - José Barahona - Ficção
A Mãe é que Sabe - Nuno Rocha - Ficção
Os belos dias de Aranjuez - Wim Wenders - Ficção (co-prod)
Até Nunca - Benoît Jacquot - Ficção (co-prod)
Pelos dados acima conseguimos constatar desde já, que a produção nacional a nível de cinema em 2016 encontra-se com números baixos, com um total de 27 obras estreadas em circuito comercial, dando uma média de 2,25 filmes com produção portuguesa estreados por mês em 2016.
Destes 27 filmes, 6 são derivados de co-produções com outros países, ou seja, o financiamento não é apenas português. E a nível de género dos filmes produzidos, 17 são Ficções, e os restantes 10 são Documentários, sendo que não existe nenhum filme de Animação dentro dos filmes estreados.
Podemos desde já aferir que, em Portugal, dá-se pouca importância e relevância ao género Animação, sendo que este tipo de filmes encontra-se sempre muito pouco representado a nível dos apoios estatais. O género de Animação (em português) nunca esteve sequer bem representado a nível de bilheteira nacional, o que não acontece com filmes estrangeiros do mesmo género, que normalmente encontram-se sempre bem colocados nas tabelas dos filmes mais vistos em Portugal, ao longo dos últimos anos.
Por exemplo, na tabela dos 40 Filmes Nacionais com maior número de espectadores em Portugal, entre 2004 e 2016 (dados até ao dia 28 de Dezembro de 2016), existe apenas um filme de Animação, O Sonho de Uma Noite de S. João, estreado em 2005, que ocupa o 21º lugar, com quase 59 mil espectadores. Mas nesta tabela também vemos apenas um filme do género Documentário, Fados, estreado em 2007, com cerca de 34 mil espectadores, ocupando o 32º lugar. Este facto apresenta se calhar uma maior relevância nesta análise, uma vez que a produção nacional a nível de Documentários tem algum peso no geral, como vemos, por exemplo, nos filmes deste género estreados no ano passado, 10 ao todo, contra os 17 de Ficção, no entanto o seu peso a nível de bilheteiras encontra-se ainda bastante aquém dos filmes de Ficção.
A quota de mercado que o cinema português tem… em Portugal, continua a ser praticamente insignificante, no que respeita ao número total de espectadores que vão às salas de cinema. Em 2016, os 27 filmes com produção portuguesa levaram aos cinemas um total de quase 300 mil espectadores, que é um número muito baixo, tendo em conta que, por exemplo, o filme mais visto em Portugal durante o ano de 2016 foi A Vida Secreta dos Nossos Bichos, (filme do género Animação), e onde sozinho teve um total de cerca de 600 mil espectadores, o dobro do número total de espectadores que assistiram a 27 filmes portugueses estreados no ano passado.
É previsível então confirmarmos que a presença de filmes nacionais nos cinemas portugueses continua a não ter grande destaque, e a não conseguir atrair espectadores às salas, sendo que na tabela dos 40 filmes mais vistos em Portugal durante 2016, apenas consta um filme português, A Canção de Lisboa, na 20ª posição, com um total de quase 188 mil espectadores.
A Canção de Lisboa trata-se de um remake do clássico filme homónimo de 1933, do realizador José Cottinelli Telmo, sendo que este factor pode estar relacionado com o sucesso que este filme representou para o cinema português em 2016, (sucesso esse muito baixo, em comparação com os filmes estrangeiros) marcando assim uma vez mais o pouco poder de bilheteira que filmes originais, quer nacionais ou estrangeiros, continuam a ter, sendo que os remakes, sequelas e spin-offs continuam a ser os grandes impulsionadores dos lucros cinematográficos.
Em comparação com o ano de 2015, o cinema português obteve menores receitas e sucessos, tendo apenas conseguido em 2016 entrar com 2 filmes para o Top 40 dos filmes nacionais mais vistos em Portugal, desde 2004, com A Canção de Lisboa (11º) e O Amor é Lindo… Porque Sim! (34º). Já no ano de 2015 foram 3 os filmes que entraram neste Top, respectivamente, O Pátio das Cantigas (1º - tornou-se assim o filme português mais visto desde 2004, com mais de 600 mil espectadores, e que representa outro remake de um clássico, neste caso de 1942), O Leão da Estrela (10º - também outro remake), Amor Impossível (31º).
2014 foi o ano que mais contribuiu para este Top 40, com 6 filmes, e 2011 o pior, onde nenhum filme português entrou nesta tabela, sendo que desde 2004 todos os anos têm entrado pelo menos 2 filmes neste ranking, com excepção do ano de 2011, e 2016 também não foi uma excepção.
Para finalizarmos esta curta análise, vamos a alguns valores totais, que marcaram o cinema em Portugal durante 2016 (com dados até ao dia 28 de Dezembro): foram quase 9 milhões de espectadores no total, sendo que, como vimos à pouco, apenas cerca de 300 mil deste total foram para filmes portugueses, sendo que assim a quota dos filmes nacionais nas bilheteiras foi de pouco mais de 3%.
Estes números demonstram como o cinema em Portugal não se encontra assim tão fraco a nível de bilheteiras, no entanto o cinema português representa uma fatia quase insignificante de todo o bolo, e com uma forte incidência nos remakes de filmes clássicos, por forma a obter uma maior receita de bilheteira, e uma expressão praticamente nula a nível de documentários ou animações no geral, sendo que no entanto as obras estrangeiras de Animação continuam a ser um dos fortes impulsionadores das receitas nos cinemas em Portugal.