08/06/2018

"Monty Python a tentar fazer o Top Gun, mas sem dinheiro para aviões"


No próximo dia 26 de Julho estreia nos cinemas portugueses o filme "Linhas de Sangue", que promete surpreender o público português e mostrar um lado mais arriscado e dinâmico do cinema português.

Realizado pela dupla de realizadores Manuel Pureza e Sérgio Graciano, este filme está a despertar a curiosidade da comunidade cinéfila em Portugal, e por aqui decidimos entrevistar um dos realizadores, Manuel Pureza, com as seguintes questões:

Em poucas palavras, como consegue descrever o que o público pode esperar de "Linhas de Sangue"?

MP - Este filme é uma loucura para ser partilhada. O que o público pode esperar são duas horas de uma história de heróis contra vilões, carregada de momentos non-sense, um bocadinho como se fossem os Monty Python a tentar fazer o Top Gun, mas sem dinheiro para ter aviões. Resta dizer que queremos muito que as pessoas olhem para este filme como uma boa oportunidade para se rirem e se divertirem. Falta-nos muito essa capacidade de nos rirmos de nós próprios, de darmos uma oportunidade ao ridículo.

Como foi possível realizar a árdua tarefa de reunir a agenda de 54 actores conhecidos do público português?

MP - Tanto eu como o Sérgio fazemos cinema e televisão já há algum tempo. Das nossas produções passadas ficam as equipas (técnicas e artísticas). Cada projecto feito em Portugal é uma aposta e um esforço colectivo que nos rouba tempo para nós, para as nossas famílias, para outras coisas. É a nossa profissão mas, acima de tudo, é uma actividade criativa que nos ocupa grande parte do tempo. Os actores e os nossos técnicos tornam-se numa primeira instância colegas, depois amigos e, se olharmos com frieza, são a nossa família durante o período de uma produção. Se desafiarmos vários elementos de várias “famílias” nossas, tendo na mão uma boa ideia que os divirta e sobretudo que os inspire, esse convite é uma vitória logo à partida. Para além de nós querermos muito contar com esses 54 actores, todos eles queriam muito, também, arriscar connosco nisto. Fora os que não entraram e que se “indignaram” nas redes sociais…

Ao verem-se as imagens/trailers podemos ver algumas inspirações em filmes de Quentin Tarantino, Eli Roth ou Robert Rodriguez. É correcto afirmar-se isso?

MP - É correcto afirmar-se que as influências deste filme foram assumidas desde o primeiro minuto, ao ponto do Sérgio dizer com graça e muita razão (lá está a dicotomia humor e razão sempre de braço dado) que o filme nasceu nos anos 80, altura pela qual começámos a seguir religiosamente géneros, histórias e criadores. Importa sublinhar que não temos qualquer pretensão de ser o Tarantino português. Tarantinos há-os em todo o planeta e não almejamos de todo ser mais uns. Somos portugueses, temos o nosso cunho, sendo certo que também nós assumimos a reciclagem de linguagens e referências, porque achamos que faz todo o sentido.

Imagem de "Linhas de Sangue"

A história deste filme tem como base uma curta-metragem de 2011. Qual foi o maior desafio em adaptar e alargar a história para uma longa-metragem?

MP - O desafio foi continuar a mesma linha de escrever e criar sem limite, sem medo do humor, mais ou menos negro, sem medo de criar uma história, camuflada de história de heróis e vilões, que se transforma rapidamente numa sátira político-social do nosso país. Fazer isso num país que tem algum pudor em aceitar o que é novo (para dar um exemplo, não houve nenhuma marca que, mesmo contando com 54 dos actores mais conhecidos do panorama nacional, quisesse arriscar nisto connosco) foi o maior desafio, porque em boa verdade esse poderia ser um aspecto que nos tolheria a vontade de teimosamente continuar a sonhar este filme. Agora ele está feito, tem criado buzz e achamos que pode vir a ser o marco que sonhámos no cinema português.

Temas que vão desde o terrorismo ao alojamento local estão presentes em "Linhas de Sangue". Pode-se dizer que este é um filme muito contemporâneo?

MP - Tal como já referi, o filme é uma sátira aos nossos dias. Sendo certo, que na maioria das vezes se olharmos de fora, o país, a Europa e o Mundo, não precisam de um grande argumentista para fazerem uma sátira ou uma comédia das suas próprias acções. Portugal precisa de ser caricaturado de maneira séria, de maneira adulta, mesmo (e sobretudo) se essa caricatura vier nos moldes arquetipais e narrativos dos filmes americanos que (ainda) nos fazem levantar do sofá e ir até um sala. Porque não sonhar que os portugueses podem fazer o mesmo para se rirem em português?

Já se pode falar em "Linhas de Sangue 2"?

MP - Não é segredo para ninguém que o nosso objectivo é dominar o mundo. Por isso, já o dissémos várias vezes, sim o Linhas de Sangue é uma trilogia. Queremos ver como corre este primeiro capítulo. Se ficarmos convencidos com a reacção do público, fazemo-nos à estrada para rodar o argumento do "Linhas de Sangue 2: Dinastia". Mas mais pormenores… só daqui a uns tempos!

Poster de "Linhas de Sangue"

05/06/2018

Uma "macacada" com qualidade

Crítica: Planeta dos Macacos: A Guerra

2017


Poster de "Planeta dos Macacos: A Guerra"

A saga "Planeta dos Macacos" remete-nos para histórias e adaptações já com alguns anos de vida, contudo em 2011 estreou o primeiro filme de uma trilogia para adaptar em parte esta história a uma nova geração, e em 2017 conclui-se este capítulo, com a estreia de "Planeta dos Macacos: A Guerra". É bastante raro que uma saga de filmes consiga manter o interesse do público e da crítica ao longo de todos os seus filmes, mas esta nova onda de 'macacos' conseguiu esta proeza, ora veremos.

Primeiro foi "A Origem" em 2011, depois veio "A Revolta" em 2014, e por fim chega "A Guerra" em 2017, sendo que, por exemplo, o seu ranking no site IMDb é de, respectivamente, 7.6, 7.6 e 7.5. Para além disso estes três filmes foram todos nomeados no seu respectivo ano ao Óscar na categoria de Melhores Efeitos Especiais, sendo que também todos eles foram um sucesso de bilheteira.

Esta consistência ao longo de uma trilogia de filmes não só é rara como também é de louvar, e dar os parabéns aos seus criadores pela coerência e estabilidade que conseguiram aqui.

Imagem de "Planeta dos Macacos: A Guerra"

Toda a base narrativa criada em volta deste "Planeta dos Macacos" vai de encontro à sobrevivência da espécie humana, à ligação genética que temos com os macacos e aos limites da capacidade humana e da sua 'animalidade'. Este capítulo final encerra em boa forma esta linha narrativa, nunca nos deixando surpreender pela qualidade técnica aqui alcançada, e pelos efeitos especiais apresentados, que possuem uma 'realidade' assustadora e quase perfeita.

Este é um filme que pode ser visto e apreciado em separado, mas que traz mais sentido e impacto quando visto em conjunto com os dois filmes anteriores, como seria de esperar. Para quem já conhece e acompanha esta saga não há muito mais a acrescentar, e para quem não conhece sugiro que o faça, porque irá surpreender-se pela positiva.

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31/05/2018

Ilha dos Cães ou Prisão Canina?

Crítica: Ilha dos Cães

2018


Poster de "Ilha dos Cães"

Não existem muitos realizadores ou realizadoras que conseguem ter um estilo muito próprio e demarcado do restante universo cinematográfico, mas Wes Anderson é sem dúvida um deles, e esta sua "Ilha dos Cães" é mais uma obra que segue a sua linha muito única de contar e mostrar uma história, e é também sem dúvida uma boa adição à sua filmografia.

Para quem já conhece o histórico deste realizador não vai ficar espantado com esta narrativa nem com este estilo de animação, uma vez que já não é a primeira vez (e não deverá ser a última) que Wes Anderson realiza um filme animado com recurso a 'puppets', ou que utiliza esta técnica em outros filmes.

Imagem de "Ilha dos Cães"

São diversas as analogias que a história explorada nesta "Ilha dos Cães" traz à baila, e que são intemporais, mas que se enquadram também bastante bem na situação actual das sociedades mais modernas. Talvez falte aqui um pouco mais de dinâmica ou de ambição na apresentação de certas temáticas, contudo não deixa de ser algo com que nos conseguimos identificar ou inserir.

Estamos perante um bom filme ao estilo de Anderson, e para quem não conhece este realizador, ou a sua obra, tem aqui uma boa porta de entrada para o seu mundo cinematográfico que consegue ser tão fascinante.

Mau | Meh | Bom

29/05/2018

Uma escolha impossível, muito Kubrickiana

Crítica: O Sacrifício de Um Cervo Sagrado

2017


Poster de "O Sacrifício de Um Cervo Sagrado"

A estrutura de um filme cujo título é (tradução literal) "O Sacrifício de Um Cervo Sagrado" poderá não ser a mais comum de todas. E esta afirmação é correcta. Contudo não deixa de ser uma estrutura cinematográfica única e que mantém o interesse do público de uma forma que pode incomodar, mas que ao mesmo tempo atrai e é magnética.

Para quem já conhece o estilo e o trabalho do realizador Yorgos Lanthimos, então este tipo de narrativa pode já não ser nenhuma novidade, mas isso não significa que não deixa de surpreender e de deixar a sua marca após os créditos finais.

Imagem de "O Sacrifício de Um Cervo Sagrado"

Com um estilo muito Kubrickiano, toda a estética e a componente visual deste filme estão pensadas ao pormenor e toda a equipa consegue aqui criar um ambiente quase inexistente numa sociedade actual, mas que no entanto encontra-se presente no dia-a-dia de muitas classes sociais.

A utilização do suspense em harmonia com uma banda-sonora avassaladora criam ainda um maior impacto do que aquele que a história em si já tem consigo, e a envolvência com o espectador é ainda mais intrigante. Todo o elenco está também de parabéns, com interpretações muito coesas e que se enquadram em toda a ambiência criada, com destaque principalmente para todo o elenco jovem/infantil e para a actriz Nicole Kidman.

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27/05/2018

Boas sequelas? Sim, existem!

Crítica: Deadpool 2

2018


Poster de "Deadpool 2"

As sequelas são normalmente filmes ora muito desejados ora muito odiados, pois o público quer bastante ver a continuação da história anterior mas cria também expectativas elevadas e caso essas mesmas expectativas não sejam satisfeitas então temos um problema. Mas não é isso que se passa aqui.

No caso de Deadpool 2 as expectativas são satisfeitas e atrevo-me até a dizer que são superadas, sendo que este filme consegue ser ainda mais atrevido que o primeiro e isso surpreende o público, mesmo para uma pessoa que já sabe ao que vai, e isso não é comum de se ver numa sequela. É caso para dizermos: que venha o terceiro.

Imagem de "Deadpool 2"

Com personagens secundárias que já conhecíamos anteriormente, mas também com novas caras à mistura, passamos a conhecer um pouco mais sobre o mundo que rodeia Deadpool e uma faceta mais séria desta personagem, mas onde não faltam os momentos cómicos e outros tantos WTF (What The Fuck?), sendo que o risco é maior mas compensa. Estamos perante um Deadpool mais adulto? Nem tanto assim, como seria de esperar.

A estrutura aqui utilizada é similar à utilizada no primeiro filme, e isso faz bastante sentido, por forma a não desvirtuar o estilo do primeiro filme, mas em algumas partes sentimos alguma previsibilidade nesta continuação, mas nada que se sobreponha às novidades que são aqui apresentadas. Para quem é fã do primeiro filme (como eu), não vai ficar desapontado com esta sequela.

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20/05/2018

Um soldado como poucos

Crítica: Soldado Milhões

2018


Poster de "Soldado Milhões"

Um pedaço da história portuguesa durante a Primeira Guerra Mundial é retratado neste "Soldado Milhões", um filme que consegue representar de forma bastante realista uma época e uma sociedade portuguesa, e concretiza tudo isso através de uma estética e imagem com bastante qualidade técnica, servindo este filme quase como que uma prova daquilo que o cinema português é capaz de produzir nos dias de hoje.

A narrativa aqui apresentada encontra-se dividida em duas partes e duas épocas, num jogo narrativo que vai saltando de uma história para a outra de forma sucessiva, e que já vimos em tantos outros filmes, contudo sentimos que aqui esta opção narrativa talvez não tenha sido a melhor, pois uma das narrativas sobrepõe-se à outra e vê-se que a balança não fica aqui equilibrada.

Imagem de "Soldado Milhões"

Como a parte do argumento não consegue ser tão ambiciosa como algumas cenas e sequências mais bélicas que assistimos ao longo do filme, fica-se com um sentimento misto e com um pouco de pena que esta história não tenha sido contada de forma mais entusiasmante, pois toda a componente técnica e todo o elenco estão de parabéns pelo trabalho realizado, mas é difícil de nos desprendermos do guião.

Porém, este tipo de filmes portugueses devem de ser financiados e motivados a serem realizados e a contarem histórias portuguesas como esta e que possam de forma mais massiva levar o público português a ir às salas de cinema ver cinema falado e realizado em português.

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04/05/2018

Silêncio que se vai ver um filme...

Crítica: Um Lugar Silencioso
2018


O género cinematográfico mais mainstream ligado ao suspense e terror, tem mostrado nos últimos tempos que consegue ainda surpreender o público, principalmente quando traz uma temática nova ou uma abordagem diferente. Veja-se por exemplo o caso do filme "Foge" (Get Out), que sendo um filme dentro deste mesmo género conseguiu ser um sucesso a nível de bilheteira e junto da crítica mundial, tendo inclusivamente arrecadado 4 nomeações aos Óscares e ganho uma estatueta (Melhor Argumento Original).

Este "Lugar Silencioso" segue em boa parte a fórmula utilizada no filme "Foge", mas de uma forma menos pretensiosa e mais interessante, a meu ver. Aqui o componente 'medo' é construído com o tempo certo, agarrando o espectador na história principal, e não envolvendo outras narrativas paralelas que pudessem servir de distracção.

Outro atractivo que encontramos aqui é a forma como é utilizado o som e a banda-sonora, sendo que o factor auditivo é um dos mais importantes para criar tensão nos filmes deste género, e neste filme o papel do som ganha ainda mais força e destaque, pois o ruído e o barulho é em si aquilo que representa o perigo e o receio neste "Lugar Silencioso".

Imagem de "Um Lugar Silencioso"

Através de uma narrativa simples e eficaz, este filme tem todos os ingredientes que o género pede, e consegue fazer uma receita interessante e deixar a sua marca dentro do seu estilo, numa lógica de presa / predador que também não é por vezes bem explorada em outros filmes recentes.

Aconselho este 'Lugar Silencioso' ao público mais destemido e que tenha também vontade de fazer aquele tipo de perguntas após um filme destes: e se fosse eu, o que faria naquele lugar?

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